CAPÍTULO II

PROCESSO REVOLUCIONÁRIO

52. PODER LOCAL DEMOCRÁTICO

Com a Constituição de 1933 e o Código Administrativo de 1936-40, o Poder Local passa a servir como instrumento político directo dos governantes, destruindo assim as bases de descentralização democrática alicerçadas na Constituição Republicana de 1911.

O Programa do Movimento das Forças Armadas, apresentado ao povo português em 26 de Abril de 1974 e que faz parte integrante da Lei Constitucional nº 3/74,de 14 de Maio, determinava como medida imediata (A-Medidas imediatas, 2 b), “A destituição de todos os governadores civis no continente, governadores dos distritos autónomos nas ilhas adjacentes e Governadores-Gerais nas províncias ultramarinas, bem como a extinção imediata da Acção Nacional Popular”. Foram constituídas Comissões Administrativas para gerir as autarquias até à realização das primeiras eleições autárquicas, pós 25 de Abril, que tiveram lugar em 12 de Dezembro de 1976.

O poder local democrático é uma das mais belas conquistas da Revolução de Abril. O trabalho desenvolvido e a política de proximidade com as populações, são marcas identificadoras da vitória do Poder Local Democrático que viriam a ser consagradas na Constituição da República Portuguesa de 1976 (Artgo 237º a 266º). Apesar das muitas restrições ao seu desempenho introduzidas no sistema, ao longo dos 37 anos já passados, é às autarquias que o país fica a dever grande parte do progresso registado em termos da qualidade de vida das populações.

À data do 25 de Abril de 1974, Portugal era um país empobrecido, com enormes carências de toda a ordem: ao nível do alojamento com mais de 25% da população (mais de 2.000.000 de pessoas) sem habitação condigna; ao nível da educação com índices de escolaridade baixíssimos e uma elevada incidência do analfabetismo (26% da população); ao nível do saneamento básico onde os índices que foi possível apurar são reveladores do atraso registado face à generalidade dos países europeus (níveis de atendimento no abastecimento de água na ordem dos 49%, na recolha das águas residuais na ordem dos 32% e no tratamento das águas residuais apenas 1%).

Em relação ao abastecimento de água e tratamento das águas residuais, até 1993 vedado à iniciativa privada pela Lei da delimitação dos sectores, já em 1994 o Inquérito de Saneamento Básico revelava os seguintes níveis de atendimento para o território de Portugal Continental:

- Água para consumo público - 85%

- Recolha de efluentes urbanos - 60%

- Tratamento águas residuais urbanas - 35%

- Registava ainda o valor de 20% para a Recolha e tratamento de resíduos sólidos urbanos.

É altura para referir e acentuar que esta evolução se ficou a dever quase exclusivamente ao esforço dos municípios. Posteriormente o Estado Central veio a assumir crescentes responsabilidades no sector, em particular com a execução dos Quadros Comunitários de Apoio. E é também a partir de 1993 que fica aberta a possibilidade da gestão privada destes sistemas, pressupostamente para contribuírem para o financiamento das infraestruturas necessárias, o que se veio a revelar de reduzida expressão.

Como consequência da execução das obras programadas e apoiadas no âmbito dos II Quadro Comunitário de Apoio (1994-2000), III Quadro Comunitário de Apoio (2000-2006) e do QREN (2006-2013) e do esforço continuado das autarquias ao nível da sua capacidade própria de execução e ao nível da comparticipação nacional nas obras financiadas pela Comunidade, foi possível atingir valores que hoje se situam, muito provavelmente, acima das metas estabelecidas:

- Abastecimento de água - 95%

- Saneamento (ligação domiciliária e tratamento) - 90%

Chegados aqui, impõe-se questionar: Com que argumentos se pretende agora impor a privatização total da gestão do sector?

Depois deste esforço todo? E quando a ONU declara, em 2010, o acesso à água e ao saneamento como um Direito Humano Fundamental. Não é a água um bem essencial à vida que a todos deve ser garantida?

A gula do capital financeiro internacional não tem limites, como não tem limites a subserviência dos seus lacaios internos. Querem tudo! A bolsa e a vida. Vamos deixar?

Poderíamos ainda falar nas melhorias introduzidas na rede viária, na distribuição de electricidade, como também poderíamos falar no apoio ao desenvolvimento da rede escolar, dos serviços de saúde, na dinamização das activdades culturais, desportivas, de lazer e de assistência social.

Em 2012 havia, 308 municípios, 278 no continente, 11 na Madeira e 19 nos Açores; e 4050 freguesias. A reorganização administrativa do território, resultado da aplicação da Lei 56/2012 de 8 de Novembro e da Lei 11-A/2013 de 28 de Janeiro alterou significativamente o mapa das freguesias. No prosseguimento de uma política neoliberal, profundamente subordinada a uma “troika” estrangeira (FMI, BCE e CE) efectuou-se uma fusão destrutiva de 1165 freguesias afastando as populações da participação da gestão democrática dos territórios onde vivem/residem e criando-lhes acrescidas dificuldades, sobretudo nas zonas rurais.

Dirigentes da Associação Conquistas da Revolução (ACR), Modesto Navarro, Duran Clemente, José Emílio da Silva, Baptista Alves e Joaquim Varino Ponte têm participado activamente no Movimento Autárquico.